domingo, 28 de janeiro de 2018

os espelhos


Tava lembrando de um artigo aleatório desses do Buzzfeed sobre representatividade - não lembro muito bem quando foi, mas lembro de ler sobre um cara que ganhou o Pulitzer de melhor ficção, chamado Janot Diaz, falando sobre vampiros: 

"Sabe, nas histórias, os vampiros não têm reflexos em espelhos, e se eles não têm reflexos em espelhos, só podem ser monstros. Então, se você quiser fazer qualquer pessoa ser vista como um monstro, é só fazer com que ela (em termos de cultura e entretenimento), não possa ser vista. Eu fui crescendo, e me sentindo, de certa forma, um desses monstros. Eu nunca conseguia me enxergar, me ver refletido em lugar nenhum e ficava pensando "Caramba, tem algo errado comigo? Será que não tem ninguém como eu por aí?" E alguma coisa nessa sensação me inspirou e eu resolvi que era minha missão criar alguns espelhos por aí. Que eu mesmo criasse os espelhos e então crianças, como a que eu fui, talvez possam se enxergar no reflexo e não se sentirem monstruosas como eu me senti." 

Resolvi fazer uma lista de séries que funcionaram como espelhos pra mim! \o/


Eu não sou muito uma pessoa de comédias, geralmente fico incomodada com algumas coisas, ou acho ofensivo, sei lá, eu não gosto muito - mas essa série é a grande culpada por este post. Eu maratonei e vi de uma vez as duas temporadas disponíveis na Netflix na última sexta e criei um carinho GIGANTE pelos personagens já no primeiro episódio, porque é muito fácil criar vínculos quando você consegue se enxergar em alguma coisa! 

One Day At A Time fala sobre uma família latina que mora nos Estados Unidos, mostrando toda a pluralidade da vida desses personagens num roteiro que se preocupa em ir além dos estereótipos rasos de sempre com uma dose incrível de empoderamento feminino. A chefe da família, Penélope, é uma mãe solo recentemente divorciada, ex-militar que estuda para se tornar enfermeira-chefe enquanto cria seus filhos, Alex (um boy gentil e sensível que se desdobra pra ser popular na escola) e Elena (falo dela já já), com a ajuda da abuelita, Lydia - que é sozinha um motivo pra se assistir a série toda porque MA-RA-VI-LHO-SA essa senhora. 


Mas na real o que me fez ver a série foi Elena porque, né? A gente quando é LGBTQ fica tão carente de representatividade que não pode ouvir falar de uma personagem sptzinha bem escrita (sem nenhuma doença terminal e/ou que não morre - ainda) que a gente corre pra ver e ó, não decepciona! <3 Na primeira temporada, Elena - nerdzinha e feminista da cabeça aos pés, está prestes a completar 15 anos e tenta encontrar formas de contar sobre sua sexualidade pra família enquanto lida com diversas questões relacionadas a imigração, racismo, machismo ao mesmo tempo que te faz dar aquelas gaitadas de acordar todo mundo em casa no meio da noite. 

É realmente impossível não se apaixonar pela série (e por Elena). Se faça esse favor e vai ver tudo - depois vem comentar comigo.


This is Us é o tipo de série que te dá abraços. Tapas na cara, apertos no peito também, alguns choros soluçados, mas principalmente - abraços. É uma série sobre entender quem você é, do jeito que você é, aprender a respeitar sua própria história e, por tabela, a dos outros. 

O que eu acho mais incrível em This is Us é que a série cativa pelas imperfeições dos personagens. Uma mulher que não consegue se conectar muito bem com os filhos, um homem extremamente sensível desesperado pra atingir a perfeição, um rapaz que não vê muito além do próprio umbigo, uma moça que deixa os sonhos de lado e só consegue ver os próprios defeitos no espelho, e tantas outras pessoas que vão se esbarrando pela vida. 

Sterling K. Brown, o ator que interpreta Randall Pierce, ganhou diversos prêmios pelo papel, mas um deles em especial me deixou muito surpresa, porque ele foi o primeiro homem negro a ganhar um Emmy de "melhor ator em série dramática" (SIM, EM 2018), e o discurso ficou ressoando uns dias na minha cabeça: 

"Eu quero agradecer a Dan Fogelman (criador da série). Dan, ao longo da maior parte da minha carreira eu me beneficiei de escolhas de elenco daltônicas - que significa 'vamos jogar um irmão de cor nesse papel, ok?'. É sempre legal. Mas você escreveu um papel para um homem negro. Que só poderia ser interpretado por um homem negro. Então o que eu mais gostei nisso tudo é que estou sendo visto pelo que sou e sendo elogiado pelo que sou. E isso faz com quem seja muito mais difícil me ignorar, ou ignorar pessoas que se parecem comigo. Então, obrigado, Dan!"

O personagem dele na série tem reflexões sobre racismo, mas também masculinidade tóxica, amor próprio, relações familiares muito doidas, compulsões, perdão. É muito importante que a gente consiga enxergar nos filmes, nas séries, novelas, livros e no entretenimento como um todo, personagens com mais que uma só camada, com todos os tons de cinza que uma pessoa pode ter, sabe?

Eu não sei se consigo falar mais sem dar spoilers então assiste tudo aí, chora bem muito, depois me diz o que achou! (A série está em sua 2ª temporada, e infelizmente não tem na Netflix). 


A história fala de Steven, um meio-humano com poderes mágicos que ajuda um grupo de alienígenas rebeldes a proteger o planeta de ameaças intergalácticas. Steven é criado pelas amigas de sua mãe  - que também era alienígena, e morreu para que o menino pudesse sobreviver. Meio viajado né? Quando eu comecei a assistir Steven, alguma coisa me chamou atenção além do traço e das cores lindas demais, mas eu não sabia dizer exatamente o que era. Não demorou muito pra entender o motivo dos episódios de pouco mais de 10min me tocarem tão profundamente: Steven Universo é uma história sobre gente como eu. Sobre todos os desafios e responsabilidades de crescer quando você não é o que as pessoas esperam de você. É uma série que fala sobre amor e sexualidade, ansiedade, amizades, relacionamentos, consentimento, saúde mental e mais um monte de outras coisas pra uma geração inteira de crianças e adolescentes que estão aprendendo sobre empatia num desenho animado!!! 


Como ilustradora, tenho a equipe de produção praticamente toda como referência para o meu trabalho, e como mulher, acredito que pessoas como Rebecca Sugar (criadora da série e primeira mulher a comandar uma animação no Cartoon Network) devem ser lembradas num sentido histórico do entretenimento. Eu vi uma entrevista dela uma vez, era um painel da comic-con de San Diego de 2016 e ela se assumiu publicamente como bissexual ao responder uma pergunta sobre o empoderamento feminino e as temáticas LGBTQ numa série com um público infantil imenso:

"Essas coisas tem muito a ver com quem a gente é, e existe um tabu quando se trata de falar sobre isso com crianças, mas todo mundo conta histórias sobre amor e atração pra crianças. Tem tantas histórias infantis que são sobre amor, e faz uma diferença absurda ouvir uma história onde alguém como você pode ser amado, e quando você cresce sem ouvir esse tipo de coisa, um pouco de quem você é se perde. É muito importante pra mim que se fale para crianças sobre identidade, sobre consentimento e sobre tantas outras coisas. Eu quero sentir que eu existo, quero me enxergar e quero que todo mundo possa se sentir dessa forma."

É exatamente assim que eu me sinto quando assisto esse desenho, e depois de ouvir a Rebecca falando isso, eu acho que se tornou um pouco da minha missão nesse mundo também. Então vão lá ver Steven Universo.

- - - - - - - - - - BÔNUS - - - - - - - - - - - 


Orphan Black é a minha série favorita no mundo, porque dentre todas as que eu assisti na vida (que foram muitas mesmo) é a que tem a melhor representatividade feminina. É um sci-fi sobre identidade, protagonizado por uma mesma atriz: Tatiana Maslany - que interpreta mais de dez personagens completamente diferentes! \o/ E ainda, a pluralidade e profundidade dos personagens da série são apaixonantes. Mulheres de diferentes faixas etárias, etnias, interpretam cientistas, guerrilheiras, traficantes, CEOs, policiais,  hackers. Enfim, é massa. Assista.

Essa série ficou como bônus na lista porque ela é a única que já está finalizada (com 5 temporadas disponíveis na Netflix), mas vou deixar aqui um trecho de uma entrevista que sempre me deixa com os olhos cheios d'água:



Até a próxima lista! <3 

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~ Referências ~



- Sobre Espelhos e Monstros. (Junot Diaz)
- I want to feel like I exist. (Rebecca Sugar)
- Não tenho um quote pra esse link, apenas absorvam a existência desta mulher. (Tatiana Maslany) 

Um comentário:

  1. Afe, Lu, precisava ter lido isso, obrigada por compartilhar! continua escrevendo aqui, por favor! <3

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Trovoa